quarta-feira, 19 de outubro de 2011

"Vicky and Cristina decided to spend the summer in Barcelona..."


Woody Allen é um admirador confesso das mulheres. Em Vicky Cristina Barcelona (Vicky Cristina Barcelona, Woody Allen, EUA/Espanha, 2008), fica óbvio o verdadeiro gosto do diretor na tentativa de desvendar a complexa sensibilidade feminina, e isto se desenrola através da saga de duas amigas americanas em sua temporada na cidade de Barcelona, um dos centros mais vibrantes e multiculturais da Europa.
A história é desenvolvida a partir das experiências de Vicky (Rebecca Hall) e Cristina (Scarlett Johansson) diante da nova realidade que lhes é oferecida numa ensolarada capital espanhola. Como revelado nos primeiros minutos de filme, as duas mulheres compartilham da mesma opinião para quase tudo – no entanto, são radicalmente diferentes em um aspecto essencial e determinante para suas personalidades: a concepção de amor.
Vicky é realista, racional e sem muita tolerância para a dor em relacionamentos. Valoriza as ideias de compromisso sério e estabilidade, e está noiva de Doug, um “homem decente” que se encaixa com perfeição no seu projeto pragmático de futuro. Cristina, por sua vez, é passional e adepta da incerteza. Aceita o sofrimento como um componente natural de qualquer “paixão profunda”, e está convicta de que assumir alguns riscos e se entregar ao que sente são parte daquilo que ela escolheu como uma espécie de filosofia de vida.
O conflito razão versus sensibilidade vai ficando mais claro com a sequencia dos acontecimentos, principalmente com a presença inesperada de Juan Antonio (Javier Bardem), um pintor misterioso que vai mudar o rumo daquele que prometia ser apenas um inofensivo e pacato verão. Artista, de espírito livre e romântico (uma intensidade similar à de Cristina), Juan Antonio aos poucos se incorpora à vida das duas turistas que, de modos diferentes, vão sendo envolvidas por seu despretensioso charme mediterrâneo. Mesmo Vicky, a princípio imune a esse tipo de aventura amorosa, é, de certa forma, arrebatada por aquela promessa excitante de uma liberdade desconhecida.

Mas é preciso reconhecer que a figura mais intensa e marcante do longa é mesmo María Elena, a ex-mulher de Juan Antonio, encarnada por uma irretocável Penelope Cruz. Chega a ser incoerente encará-la como personagem secundária. Quando aparece, impetuosa e extrema no limite da loucura, ela (sem trocadilhos cinematográficos) rouba a cena. O amor destrutivo entre ela e Juan Antonio é uma das faces mais interessantes do filme. Ela própria uma artista de temperamento instável, não consegue, de fato, conviver com o ex-marido, ainda que se amem quase inevitavelmente. Para María Elena, “só o amor incompleto pode ser romântico”.
Um filme de mulheres fortes: tudo o mais em Vicky, Cristina, Barcelona fica quase eclipsado, mesmo a bela fotografia que vale a pena por si só. Antagônicas, indefiníveis e cheias de dramas pessoais, essas mulheres fogem aos próprios clichês que o longa delimita, e o resultado é uma representação convincente daquilo que existe de surreal e imprevisível na realidade – e na natureza feminina.

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